quinta-feira, maio 9, 2024
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A Adicção Sexual

Por Valquiria Pinto 

O que nos chama atenção na “sexualidade adictiva” é a maciça dialética entre dor e prazer, emblemática, a nosso ver, dos fenômenos em jogo.  Podemos destacar que, no intervalo entre a busca da situação sexual almejada e a execução do ato, o sex-addict pode usufruir de certos benefícios: bem-estar, excitação maníaca, asseguração narcísica, sensação de prazer, empoderamento social, macho ou fêmea alfa, histrionismo. No entanto, após a consumação do ato sexual, não é incomum o sujeito ser tomado por crescente mal-estar, e buscar outro(a) parceiro(a) porque o vazio é insuportável.

Sex-Addict, pode ser definido como quadro psicopatológico no qual o sexo é buscado de forma incontrolável, desenfreada, a despeito dos prejuízos emocionais, sociais e profissionais que suscita no cotidiano do adicto. Que após o frenesi, a excitação e a adrenalina em ceder aos próprios impulsos urgentes e vorazes, o sex-addict percebe-se incapaz de gerenciar suas atuações sexuais, sendo consumido por sentimentos de vazio, fracasso e desespero. A problemática do prazer sexual “além do princípio de prazer”, conjugada à da dor psíquica e ferida emocional, nos conduz a uma interrogação mais rigorosa sobre a dimensão do masoquismo na vida subjetiva e sua relação com os estados autodestrutivos da psicossexualidade.

A adicção sexual constitui quadro psicopatológico no qual a realização do ato sexual se impõe ao sujeito de modo compulsivo. Essencialmente, o sujeito é impelido a agir, a buscar a satisfação sexual, não importando as consequências a curto ou longo prazo.

Freud deu alguns passos à frente quando ele escreveu a tópica “Uma criança é espancada”, texto de 1919. O tema central é a fantasia em que uma criança é espancada ou observa outra ser por alguma figura parental. Essa construção se articularia a um desejo de ser espancado(a) pelo pai, desenvolvendo-se sob o impacto do amor edipiano incestuoso (Freud, 1919-1920). Geralmente inconsciente, exigiria trabalho de reconstrução em análise. Por conta da culpa, do recalcamento e da regressão à organização pré-genital anal, um desejo erótico sofreria drástica retaliação, transformando-se em desejo de espancamento. Aqui, o masoquismo é apresentado como constelação psíquica inconsciente, resultante de determinada confluência de forças, e não apenas como fenômeno perverso latente ou manifesto.

Assim, Freud (1924) desfaz a equivalência absoluta entre prazer e redução de tensão, enfatizando o fato de que o acúmulo de excitação poderia ser sentido como prazeroso no psiquismo, assim como a diminuição da tensão poderia ser sentida como desprazerosa. O prazer e o desprazer dependeriam não apenas de um fator quantitativo, mas também de um aspecto qualitativo – que, por sua vez, ele reconhece a dificuldade em delimitar.

Isso porque o masoquismo moral não está exatamente referido à montagem perversa da vida sexual, não se trata de uma posição passiva e prazerosa perante à dor infligida por um parceiro/objeto sexual (ser subjugado, humilhado, amarrado ou chicoteado em determinadas práticas), mas, sim, a modos de existir, de se relacionar, de se comportar que, à revelia dos prejuízos emocionais e psíquicos que acarreta, estão estreitamente articulados a uma satisfação libidinal. 

 

Pode-se dizer que, apesar de eventuais paralelos com a montagem perversa da vida sexual, a adicção sexual é singular e não se confunde com a perversão masoquista. No entanto, nossa hipótese é a de que, em seus fenômenos, comportaria uma dimensão masoquista, o masoquismo aí implicado sendo de ordem secundária, moral, e não estritamente erógena, primária.

Dor psíquica e prazer sexual são as questões centrais do sofrimento que teria como dimensão uma subjacente a experiência da dor – compreendida aqui como perturbação psíquica resultante de uma efração, do rompimento de barreiras internas protetoras pelo afluxo de energia não ligada (Freud, 1920). Nesse sentido, os fenômenos masoquistas não se conformariam ao postulado clássico da propensão à obtenção de prazer e evitação do desprazer, já que sinalizariam um prazer que pertenceria a uma outra ordem de funcionamento.

A adesão incontrolável a diferentes práticas sexuais revela em sua base graves prejuízos na dinâmica psíquica do sujeito adicto, afetando drasticamente as esferas de sua vida afetiva, social, profissional, familiar e, inclusive, sua condição médica geral. Ao não conseguir se abster da conduta adictiva, o indivíduo se coloca frequentemente em situações de risco, como expor-se deliberadamente a graves doenças sexualmente transmissíveis e outras circunstâncias que implicam sérias ameaças à sua integridade física e psíquica.

A descrição nosológica de adicção sexual que é subdividida em quatro fases bem distintas: (1) fase de obsessão, na qual, em resposta às dificuldades existenciais, o sujeito é totalmente absorvido por preocupações e pensamentos sexuais; (2) fase de ritualização, na qual o adicto se entrega a certos “rituais” para a busca da atividade sexual, por exemplo, utilizar aplicativos (Tinder, Grindr etc.) e/ou frequentar determinados clubes noturnos, pontos de encontro ou locais que considera propícios para a aquisição de um parceiro e/ou prática sexual (cruising, prostituição, buscas na internet, banheiros públicos etc.); (3) fase do “agir sexual” propriamente dito, durante a qual o sex-addict vive diretamente a experiência sensorial do sexo, conquistando assim certas doses ou níveis de prazer, satisfação e alívio; e (4) fase de desespero, na qual, após a experiência de apaziguamento, é consumido pelo sentimento de impotência no gerenciamento de seus impulsos sexuais, vendo-se confrontado à impossibilidade de controle de suas condutas compulsivas, Logo, nessas configurações, o prazer transitório e provisório ligado à atividade sexual termina por ser fonte de dor psíquica.

 Na esfera dinâmica psíquica do sex-addict, o conflito psíquico seria exteriorizado por meio de estratégias defensivas menos elaboradas, como: (1) a clivagem entre sentimentos e condutas sexuais, cujo principal objetivo é evitar a ambivalência afetiva e o sofrimento depressivo – consequentemente, os parceiros sexuais tendem a não ser investidos afetivamente; (2) de modo complementar, instaura-se o mecanismo da recusa, que exclui da consciência certas representações e afetos inconciliáveis com o ego ideal, mantendo-os isolados e contrainvestidos tais como: perdas, lutos, separações, tudo que poderia fragilizar a vida psíquica por ser contraditório ou doloroso é “descartado”, excluído pelo ego – e, ao perder contato com seus afetos, o adicto sexual torna-se refém de seus impulsos; (3) a idealização de objetos e/ou situações inacessíveis, paralela à extrema desvalorização desses mesmos objetos, quando a realidade, as decepções e frustrações se impõem de forma inegociável; (4) a onipotência, na qual o sujeito descarta e desinveste facilmente não apenas seus objetos sexuais, mas desconsidera regras, padrões sociais e demais códigos de boa conduta em sua busca insaciável pela atividade sexual.

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Valquiria A Pinto

Psicanalista Esportiva e Clínica.

 

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