quarta-feira, maio 1, 2024
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O “Alemão” já esteve na minha família, e agora veio me visitar

Por Paulo Roberto Reis

Instagram: @psipaulorobertoreis

Geralmente receber visita é considerada uma coisa boa. É um modo de manifestar consideração pela presença de alguém. Na nossa cultura, as pessoas costumam ser bastante acolhedoras, sobretudo quando o visitante é alguém do seu círculo familiar ou de amizade. Tem gente que adora fazer uma visitinha surpresa. Nem sempre avisa a dona/o da casa, e nem sempre é uma pessoa conhecida. Seja aquela pessoa estigmatizada chata ou não, a questão é que nem sempre desejamos receber visita. Pensando assim, nem toda visita é agradável, principalmente se for uma doença. Essa reflexão não é sobre pessoas visitadas e visitantes, mas, sim, sobre uma doença chamada Alzheimer, também conhecida como Alemão.

A Doença de Alzheimer (DA) é uma das demências neurodegenerativas mais comuns. Em todo o mundo, o número chega a 50 milhões de pessoas. A partir do crescimento da população idosa, segundo estimativas da Alzheimer’s Disease International, os números poderão chegar a 74,7 milhões em 2030 e a 131,5 milhões em 2050. De acordo com o Ministério da Saúde (2022), no Brasil, cerca de 1,2 milhão de pessoas vivem com algum tipo de demência e 100 mil novos casos são diagnosticados por ano. Na maioria dos casos, os sintomas costumam aparecer a partir dos 60 a 65 anos de idade. Porém, é uma estimativa média, já que há situações em que a doença se desenvolve em pessoas com idade inferir aos 60 anos.

O nome Alzheimer vem de Aloysius Alzheimer (1864-1915), neuropsiquiatra alemão, que foi o primeiro pesquisador a descrever os sintomas da então doença desconhecida no ano de 1906. Daí o nome Alzheimer ou popularmente conhecida como Alemão, terminologias que fazem referência ao médico que estudou e explanou sobre a patologia. Aloysius ou Alois [como era conhecido na época] fez diversas pesquisas sobre o funcionamento da mente humana, inclusive investigando a esquizofrenia e a depressão. O pesquisador era diretor de um asilo em Frankfurt, na Alemanha, e passou a acompanhar um curioso caso de demência que afetava o córtex cerebral. Assim, ao investigar a sua paciente Auguste Deter, Alzheimer pretendia comprovar a existência de “doenças do cérebro”.

Anos mais tarde, Aloysius conseguiu comprovar as suas hipóteses em relação a então desconhecida “doença do cérebro”, hoje, conhecida como Doença de Alzheimer. Essa patologia provoca, de modo progressivo, a deterioração das funções cerebrais, incluindo a perda de células nervosas. O esquecimento de acontecimentos recentes é um dos sinais da doença no seu estágio inicial. Entretanto, existem outros prejuízos na vida do indivíduo, como, confusão mental, senso crítico comprometido, alterações na linguagem, concentração, aprendizado e incompetência psicossocial. Assim, a doença vai criando outros desafios com o passar do tempo. É comum que a pessoa apresente, ainda, incontinência urinária e fecal, dificuldade para compreender e se expressar [afasia], tremores, movimentos involuntários e outras dificuldades.

Eu, na condição de psicólogo, recebo muitos pacientes diagnosticados com a Doença de Alzheimer. Uma das coisas que mais me chama à atenção no consultório são as alterações no comportamento e nas emoções desses indivíduos. Pois, essa doença provoca mudanças significativas na vida diária da pessoa, conduzindo-a para um quadro de desregulação do sistema psíquico. Não é incomum ações intensas de estresse e ansiedade, que geram insônia, choro, inquietação, perambulação, questionamento repetitivo, diminuição do prazer, irritabilidade excessiva e agressividade.

Determinados pacientes chegam com a informação de que alguém da família teve/tem a “doença do Alemão”, e acreditam que elas também terão a mesma doença. Em alguns casos, a pessoa busca ajuda psicológica com a finalidade de aprender a lidar com os sentimentos de medo e angústia em relação a “certeza” de que irá desenvolver a demência. Contudo, o fato de ter tido um familiar próximo com a Doença de Alzheimer não significa a preponderância dessa genética nos demais membros familiares. A doença não é hereditária. Esse elemento entra como um fator de risco. Alguns genes podem ser herdados, mas não entram como uma sentença predeterminada.

Uma vez ou outra, alguém chega e diz: “estou muito esquecida, acho que é a doença do Alemão”. É preciso desmistificar esse estereótipo, pois o comprometimento da memória pode estar associado a vários indicadores, inclusive estresse e fadiga. Logo, o sintoma de esquecimento não significa que o indivíduo esteja com a Doença de Alzheimer. Embora que no estágio inicial da demência, os sintomas podem ser facilmente confundidos com outras doenças – o que dificulta o diagnóstico. Nesse momento, é preciso uma série de avaliações e exames.

Cada vez mais, a psicologia junta-se a tantas outras áreas do saber, para contribuir com a pessoa em estado de demência. Nesse sentido, a psicoterapia é uma ferramenta que pode ser funcional. Porém, a psicoterapia para a pessoa com Alzheimer ou qualquer outra demência é indicada apenas na fase inicial, quando é possível estabelecer vínculo terapêutico, capaz de trabalhar com as funções cognitivas preservadas. Contudo, outras medidas podem ser propostas, tais como: reorganização ambiental, exercícios de adaptação, estimulação cognitiva, regulação emocional, treinamento de habilidades sociais, incentivo ao convívio social, além de ajudar o paciente a aderir ao tratamento. Nesse caso, vale a máxima: cada caso é um caso!

O psicólogo também pode oferecer suporte qualificado ao cuidador e demais agentes da rede de apoio do paciente, pois essas pessoas necessitam de cuidados específicos, sobretudo para não adoecerem. A ideia principal, aqui, é que se você receber a visita do “Alemão” tenha informação para saber como acolher o visitante indesejado. A Doença de Alzheimer não tem cura, mas tem tratamento. Antes de tudo, na dúvida, busque ajuda profissional. De preferência, consulte profissionais de diferentes áreas. Não se esqueça do psicólogo!

Texto autoral de Paulo Roberto Reis, mestrando em Estudos de Linguagens (UNEB), graduado em Psicologia (UCSAL), graduado em Teologia (UCSAL), pós-graduado em Gerontologia, pós-graduado em Terapia Cognitiva-Comportamental, pós-graduando em Neuropsicologia.

IMAGEM: Paulo Roberto Reis, Psicólogo, acervo pessoal.

Referências

BREMENKAMP, M. G. et al. Sintomas neuropsiquiátricos na doença de Alzheimer: frequência, correlação e ansiedade do cuidador. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia Brasileira, Rio de Janeiro, v. 17 n. 4, p. 763-773, 2014.

CASTILLO, C. M.; MASCAYANO, F.; ROA, A.; MARAY, F; SERRAINO, L. Implementación de um programa de estimulación cognitiva em personas com demência tipo Alzheimer: um Studio piloto em chilenos de la tercera edad. Universidad Psicología, Bogotá , v. 12, n. 2, p. 445-455, 2013.

DIAS, E. B. O cuidador da pessoa com doença de Alzheimer: revisão de literatura. 2013. 37f. Trabalho de Conclusão do Curso em Enfermagem Psiquiátrica em Saúde Mental – Faculdade de Medicina em Marília, São Paulo.

MAYO CLINIC. Doença de Alzheimer. 2023. Disponível em: https://www.mayoclinic.org/diseasesconditions/alzheimers-disease/symptoms-causes/syc-20350447. Acesso em março de 2023.

PAULINO, A.S.; SILVA, D.D.; QUINTILIO, M.S.V. Doença de Alzheimer em idosos: Atuação do enfermeiro com o paciente. Rev Inic Cient e Ext. v.5, n.2, p.860-66, 2022.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1 COMENTÁRIO

  1. E muito importante, ter conhecimento dessa doença, quanto mais informações, podemos buscar ajuda , para ter uma qualidade melhor de vida. Não sei se tem cura, mas acredito q tem alguns caminhos que podem ajudar muito no tratamento e na prevenção.

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