terça-feira, maio 14, 2024
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Glória Estefan à brasileira

Por Paulinho Goetze
@paulinhogoetze

 

Meu primeiro contato com Glória Estefan foi em 1996 ao ouvir a canção “Reach”, gravada para os Jogos Olímpicos daquele ano em Atlanta. Obviamente eu, no alto dos meus 12 anos, não fazia a menor ideia de quem seria aquela cantora, muito menos sabia sua história. Em 1998, ela esteve no Brasil para divulgar o lançamento do disco “Glória!” e eu escutei uma entrevista na antiga rádio Jovem Pan. Tenho uma fita K7 até hoje com essa entrevista. De lá pra cá consumo com muito entusiasmo e atenção tudo o que ela produz. Esse curto histórico da minha aproximação com ela é para celebrar a chegada de “Brazil305”, novo álbum da cubana radicada nos Estados Unidos. A beleza e os símbolos desse trabalho já começam desde o nome que procura promover uma ponte entre o nosso país e Miami, onde a cantora mora (305 é o código de área da localidade). Glória contou em entrevistas que há pouco tempo descobriu também que 305 é o número de etnias indígenas do Brasil, o que a conecta ainda mais diretamente com as raízes do nosso país.
Desde 2013 sem lançar um trabalho inédito (o último foi o “The Standards”, em que gravou o clássico brasileiro “Eu Sei Que Vou Te Amar”, de Tom Jobim e Vinícius de Moraes), Glória Estefan celebra o Brasil desde a estética até a escolha dos ritmos e dos convidados. Ela esteve aqui em 2019 para gravar algumas canções, videoclipes e um documentário chamado “Sangre Yoruba”, ainda sem data de lançamento, mas com trailer já disponível nas redes. Nessa ocasião ela veio a Salvador, onde se encontrou com o mestre Carlinhos Brown, no Candeal, para juntos gravarem a canção “Magalenha”, de autoria dele, e conversarem sobre as origens do samba em cenas que estarão no documentário.

Também em Salvador, Glória gravou o videoclipe do primeiro single deste álbum: “Cuando Hay Amor”, que conta com a presença das maravilhosas Ganhadeiras de Itapuã em plena Lagoa do Abaeté. A cantora aparece no clipe no centro de uma roda de samba da melhor qualidade com o grupo de mulheres que mantém viva a cultura do nosso povo e traz para o centro das atenções a memória das “escravas de ganho” (por isso o nome “ganhadeiras”) que faziam trabalhos como a venda de quitutes e a lavagem de roupa para juntar algum dinheiro e conseguir libertar outras pessoas escravizadas. O clipe, que já conta com quase 3 milhões de visualizações, tem imagens da cidade de Salvador, de Cachoeira, no recôncavo da Bahia, berço do samba de roda e, portanto, do próprio samba, e do Rio de Janeiro, além de mostrar nossas manifestações culturais, a exemplo da capoeira, o delicioso samba de dona Nicinha, e o que temos de melhor: nossa gente.

A ideia do álbum, lançado no último dia 13 de agosto, é mostrar como seria pautada a carreira de Glória Estefan se ela fosse brasileira, por isso foram regravadas canções icônicas de sua carreira em roupagens totalmente diferentes e inusitadas. São 18 canções no total, sendo 14 regravações e 4 inéditas na voz de Glória. “É o ritmo da Bahia…”, anuncia ela na primeira faixa do álbum. Como não poderia deixar de ser, o set list começa com “Samba”, novo título para o sucesso “Conga”, lançado originalmente por Glória em 1985 ainda com a banda Miami Sound Machine, mas dessa vez na batida inconfundível do samba carioca com direito a apitos e cuícas, instrumentos característicos das Escolas de Samba do Rio de Janeiro e São Paulo. Inclusive o videoclipe de “Samba”, gravado na quadra da Portela, também já está disponível no YouTube. Em seguida, “Un Nuevo Mundo” chega com uma sonoridade muito familiar para nós, brasileiros, pois trata-se da versão em espanhol da canção “O Homem Falou”, de Gonzaguinha, lançada por ele em meados da década de 1980 e regravada em 2007 por Maria Rita.
Os grandes sucessos da vitoriosa carreira de Glória Estefan se descortinam em versões deliciosas de ouvir como “Mas Allá” em Bossa Nova, “Rhythm Is Gonna Get You” num samba exaltação vibrante, “Cuts Both Ways” e “Here We Are” em versão pagode, “Mi Tierra” digna de uma boa gafieira com bailarinos de dança de salão, além do bolero “Hasta Siempre” e um grande ponto alto pra mim que é a versão de “Get On Your Feet”, uma das músicas mais importantes da discografia de Glória, em versão samba-reggae que me leva para as ladeiras do Pelourinho toda vez que ouço. O álbum encerra com “Only Together”, versão em inglês da já citada “O Homem Falou” e, por fim, “Magalenha”, em dueto com Carlinhos Brown em português.
Glória Estefan se volta para o Brasil no momento em que a nossa arte e cultura estão sofrendo constantes ataques. É um olhar de fora que valoriza o que temos de melhor: nosso povo, nossa música, nossa história. Vale à pena ouvir o disco com atenção entendendo cada arranjo e percebendo como o que é feito no Brasil tem relevância e importância mundial. Precisamos nos valorizar mais, olhar pra nós com admiração.
“Arriba com la Samba…”!
Até a próxima quarta!

Fontes:
Imagem 1: Instagram oficial de Glória Estefan
Imagem 2: Site Midiorama publicado em 16 de Agosto de 2020
Imagem 3: Instagram oficial de Glória Estefan
Imagem 4: Site da Revista Veja publicado em 21 de Agosto de 2020

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