Por Dr. Paulo Roberto Reis
Psicólogo Clínico
A recente morte de Preta Gil, artista tão presente na vida cultural brasileira, nos convida a refletir sobre o impacto que a morte de pessoas públicas provoca em nós. Ainda que não a conhecêssemos pessoalmente, muitos de nós sentimos um vazio, uma dor silenciosa e coletiva. É como se partes de nossa história também fossem levadas com ela. A morte, por mais certa que seja, ainda nos assusta e paralisa. Por isso, falar sobre o luto é também falar sobre a vida.
Na Psicologia, o luto é compreendido como um processo natural de adaptação diante de uma perda significativa. Como afirma Elisabeth Kübler-Ross (1996), o luto passa por fases como negação, raiva, barganha, depressão e aceitação — embora nem todos percorram esse caminho de forma linear. A perda, sobretudo pela morte, desorganiza nossa estrutura psíquica e exige de nós um árduo trabalho de ressignificação. Não se trata de “superar”, mas de aprender a viver com a ausência. Cada história de luto é única.
Preta Gil, em seus últimos meses, viveu com dignidade, afeto e consciência. Compartilhou sua vulnerabilidade e sua esperança, sensibilizando milhares de pessoas sobre o valor do tempo presente. A morte dela nos recorda que é possível encarar a finitude sem negá-la ou romantizá-la. Segundo a psicóloga Maria Helena Franco (2005), falar sobre a morte é também um modo de cuidar da vida. Quando nos permitimos vivenciar o luto, damos espaço à transformação emocional.
A Psicologia do Luto busca acolher o sofrimento psíquico que emerge após a perda, favorecendo a expressão das emoções e a reconstrução do sentido da vida. O silêncio, muitas vezes imposto socialmente a quem sofre, pode adoecer. Como lembra Colin Murray Parkes (2009), o luto não vivido pode se transformar em dor crônica e até em sintomas físicos e emocionais mais graves. Por isso, a escuta qualificada e o apoio psicoterapêutico tornam-se fundamentais nesse percurso.
A psicoterapia, nesses casos, não é um espaço para “esquecer” quem se foi, mas para lembrar de maneira saudável. Ela permite que o enlutado elabore suas memórias, dores, culpas e sentimentos ambivalentes. O psicoterapeuta atua como um facilitador do processo, respeitando o tempo subjetivo de cada pessoa. Em especial diante de perdas traumáticas ou inesperadas, o acompanhamento psicológico pode prevenir complicações como transtorno de depressão ou isolamento social. Luto também é questão de saúde mental.
A morte de Preta Gil, com toda sua exposição e simbolismo, nos ensina sobre a urgência de viver com mais presença e afeto. Ensina também que a dor compartilhada pode ser mais leve. Que tenhamos coragem de falar sobre o morrer, de cuidar dos nossos enlutados e de buscar ajuda quando a dor se fizer maior que nós. Afinal, como bem disse Rubem Alves: “o luto é o preço que se paga por amar”. E amar, mesmo diante da perda, ainda é o que dá sentido à vida.
Paulo Roberto Reis é psicólogo clínico especializado em Terapia Cognitivo-Comportamental e idealizador da Longevos Psicologia, uma clínica voltada para o cuidado da saúde mental e longevidade. Graduado em Psicologia pela Universidade Católica do Salvador (UCSAL), Paulo é também mestrando em Estudo de Linguagens pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Com uma sólida formação acadêmica, é pós-graduado em Gerontologia, Terapia Cognitivo-Comportamental e Neuropsicologia. Além de sua prática clínica, Paulo é colunista do Portal Som de Papo, onde escreve sobre saúde mental aos domingos, contribuindo com informações e reflexões sobre o bem-estar psicológico.
REFERÊNCIAS
FRANCO, Maria Helena Pereira. Vivências do luto. 2. ed. São Paulo: Summus, 2005.
KÜBLER-ROSS, Elisabeth. Sobre a morte e o morrer: o que os doentes terminais têm para ensinar a médicos, enfermeiras, religiosos e aos seus próprios parentes. 9. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
PARKES, Colin Murray. Luto: estudos sobre a perda na vida adulta. 2. ed. São Paulo: Summus, 2009.
Imagem: Preta Gil. Reprodução Instagram.



