Por André Henrique
A notícia de que menos de 3 % das cidades brasileiras estão perto da universalização dos serviços de saneamento básico expõe uma realidade que choca pela sua discrepância: em um país com mais de 5 500 municípios, a grande maioria ainda não garante acesso adequado à água potável e ao tratamento de esgoto de forma ampla e efetiva. Essa estatística demonstra que, apesar de legislações e marcos legais recentes voltados para melhorar o setor, o Brasil ainda enfrenta um dos maiores desafios de infraestrutura e saúde pública de sua história recente, com impactos sociais, econômicos e ambientais profundos.
A importância do saneamento básico para a saúde pública
O saneamento básico não se resume à coleta de lixo ou à distribuição de água; ele envolve um conjunto de serviços que incluem abastecimento de água tratada, coleta e tratamento de esgoto, manejo de resíduos sólidos e drenagem urbana. Quando esses serviços são insuficientes ou inexistentes, surgem consequências imediatas e graves para a saúde da população.
Doenças de veiculação hídrica, como diarreias, hepatites, esquistossomose, leptospirose, proliferam em ambientes com esgoto a céu aberto e água contaminada. Estudos mostram que a falta de saneamento está diretamente associada a elevações nas taxas de hospitalizações, especialmente em crianças pequenas, e ao aumento da mortalidade evitável. Uma nota técnica do Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social aponta que municípios com baixa cobertura de saneamento apresentam taxas de hospitalização muito superiores às de localidades com serviços adequados.
Além disso, a ausência de saneamento agrava vulnerabilidades sociais já existentes, afetando principalmente populações pobres e residentes em áreas periféricas ou rurais, onde a infraestrutura é ainda mais precária.
Universalização: meta ambiciosa, obstáculos reais
O Novo Marco Legal do Saneamento Básico (Lei nº 14.026/2020) estabeleceu metas objetivas:
– 99 % da população com acesso à água potável e
– 90 % com coleta e tratamento de esgoto até 2033.
No entanto, os números disponíveis em 2025 revelam que a grande maioria dos municípios ainda está muito distante desses objetivos. Enquanto algumas cidades, especialmente no Sudeste e Sul, conseguem cobertura quase plena, outras regiões enfrentam índices extremamente baixos tanto no acesso à água quanto ao esgoto.
Essa desigualdade regional mostra que as políticas públicas ainda não alcançaram uniformidade efetiva. Municípios pequenos e economicamente vulneráveis, sobretudo no Norte e Nordeste, ainda carecem de investimentos robustos e de capacidade técnica para manter a expansão das redes de saneamento.
Impactos econômicos da falta de saneamento
A ausência de saneamento extrapola a saúde e afeta diretamente a economia. A economia de um município ou estado sofre quando grande parte dos recursos é gasta com tratamento de doenças evitáveis, absenteísmo no trabalho, menor produtividade e menores oportunidades de desenvolvimento econômico local.
Relatórios e audiências públicas no Senado apontam que seriam necessários cerca de R$ 900 bilhões para que o Brasil possa realmente universalizar os serviços até 2033, um valor alto, mas compatível com os benefícios sociais e econômicos gerados pela universalização.
Além disso, estudos demonstram que cada R$ 1,00 investido em saneamento básico pode resultar em R$ 4,00 a R$ 5,00 economizados em custos de saúde, evidenciando o retorno social e econômico de investir nessa infraestrutura essencial.
Saneamento e meio ambiente: uma relação inseparável
O saneamento básico também está profundamente ligado à preservação ambiental. Sem tratamento adequado de esgotos, rios, lagos e cursos d’água recebem cargas orgânicas elevadas que afetam a biodiversidade aquática, contaminam mananciais e prejudicam ecossistemas inteiros.
A poluição hídrica ainda impacta áreas de recarga de aquíferos e afeta a disponibilidade de água de boa qualidade, comprometendo futuros abastecimentos. Quando consideramos que o Brasil é lar de grandes bacias hidrográficas e uma das maiores reservas de água doce do planeta, a falta de saneamento se torna um paradoxo grave: teremos água, mas ela será inadequada para uso seguro ou saudável se continuarmos a contaminar nossos recursos naturais.
Desafios e caminhos para o futuro
Embora o quadro seja preocupante, existem experiências de sucesso que demonstram que a universalização é possível. Alguns municípios brasileiros já alcançaram níveis plenos de atendimento com água potável e esgoto coletado e tratado, casos que servem de modelo e inspiração para outras localidades.
Mas para avançar de fato, é preciso:
Aumentar investimentos públicos e privados de forma articulada;
Fortalecer a regulação e a governança dos serviços de água e esgoto;
Garantir financiamento sustentável que não onere excessivamente os usuários;
Fomentar parcerias entre municípios maiores e menores para compartilhamento de infraestrutura e capacidade técnica;
Ampliar a conscientização pública sobre como saneamento está ligado à saúde, dignidade humana e desenvolvimento econômico.
Conclusão
A realidade de que menos de 3 % das cidades brasileiras estão perto da universalização do saneamento evidencia um problema estrutural, não apenas de infraestrutura, mas também de prioridade política e consciência social. Saneamento básico é muito mais do que rede de canos; ele é um direito constitucional, conectado à dignidade da pessoa humana, à saúde pública, ao meio ambiente equilibrado e ao desenvolvimento sustentável.
Investir em saneamento não é apenas uma política pública: é uma decisão estratégica de saúde, economia e justiça social. E, à medida que caminhamos para 2033, não podemos mais adiar essa agenda civilizatória fundamental.
Se você deseja aprender mais sobre como iniciar na área ambiental e fazer a diferença no mercado de trabalho, confira o eBook “Como Iniciar sua Consultoria Ambiental” disponível na Hotmart. Com ele, você terá um guia prático para iniciar nas carreiras ambientais.
André Henrique de Rezende Almeida
@BIOLOGOANDREHENRIQUE
Biólogo CRBIO 02: 60.945
Engenheiro Ambiental CREA: ES-055476/D



